Para uma vivência universitária
Para aqueles que lograram êxito nos exames vestibulares, conseguindo vaga 2010 nas instituições não-embromatórias do ensino superior brasileiro, vale a pena uns instantes de reflexão para aprimorar uma “enxergância” binoculizadora mais ajustada aos desafios de um mundo que rapidamente torna-se diferenciado, em alguns setores em visível processo de desintegração.
Para os novos acadêmicos, explicito duas sinalizações, uma feita pelo saudoso economista Celso Furtado (“O planejamento não deve destruir as raízes da criatividade”). A outra advém do também eternizado professor William Edwards Deming ("A transformação não significa apagar incêndios, resolver problemas ou criar melhorias simplesmente cosméticas. A transformação deve ser feita por pessoas que detenham um profundo conhecimento"). Dois balizamentos que deveriam ser memorizados para quem busca uma profissionalidade ouro de lei, permanentemente criativa, nunca mimética. Tampouco nostálgica. Jamais autoritária, ainda que portando consistente autoridade.
Muitos dos atuais executivos brasileiros, de instituições públicas e privadas, ainda não perceberam que suas áreas de comando se encontram em processo de deterioração. Por não atentarem, eles e seus comandados, que o fator Trabalho se despojou de uma simples materialidade, tornando-se polo gerador de um paradigma que deveria envolver a criatividade, a parceria, a flexibilidade, a versatilidade e a capacidade de sempre apreender novos cenários.
Como aprimorar uma trabalhabilidade que reflita a capacidade do ser humano desenvolver competências, aprofundar o seu auto-conhecimento, ampliar parcerias e assumir posições de comando? E como desmontar as cavilosidades dos invejosos, daqueles que não conseguem assimilar, por vaidade patológica ou desatualização gerontológica, a dinâmica dos tempos de agora? Eis os desafios para os jovens universitários 2010, muitos quase adolescentes, ainda atrelados às cavilações familiares vinculadas ao períodos que não mais retornarão.
Miguel de Cervantes, o pai do Dom Quixote, proclamou que “não há amizade, parentesco, qualidade, nem grandeza que possam enfrentar o rigor da inveja”. Uma tese a ser superada, se pelos novos universitários forem eficazmente vivenciadas algumas diretrizes comportamentais: 1. Leve em consideração que grandes amores e novas conquistas envolvem sempre grandes riscos; 2. Quando perder, não perca a lição; 3. Observe os três Rs: Respeito a si mesmo, Respeito aos outros e Responsabilidade por todas as suas ações; 4. Lembre-se que não conseguir o que você quer é algumas vezes um estupendo lance de sorte; 5. Aprenda as regras de modo a saber quebrá-las da maneira a mais apropriada; 6. Não deixe uma disputa por questões menores ferir uma grande amizade; 7. Quando perceber que cometeu um erro, tome providências imediatas para corrigí-lo; 8. Passe algum tempo sozinho todos os dias; 9. Abra seus braços para as mudanças, sem abrir mão de seus valores; 10. Lembre-se que o silêncio é algumas vezes a melhor resposta; 11. Viva uma vida sempre honrada. Assim, quando ficar mais velho e pensar no passado, poderá obter prazer uma segunda vez; 12. Uma atmosfera de amor em seu ambiente é fundamental para um caminhar que satisfaz; 13. Em discordância com entes queridos, trate apenas da situação corrente, sem levantar questões passadas; 14. Compartilhe amplamente o seu conhecimento, uma maneira de alcançar a imortalidade; 15. Seja gentil para com a terra; 16. Uma vez por ano, vá a algum lugar onde nunca esteve antes; 17. Lembre-se que o melhor relacionamento é aquele em que o amor mútuo excede o amor que cada um precisa do outro; 18. Julgue o seu sucesso por aquilo que teve de renunciar para consegui-lo; 19. Entregue-se total e irrestritamente nas mãos de Deus, consciente do seu papel de também construtor do Reino; 20. Sinta-se em contínua superação, como a metamorfose ambulane do Raul Seixas.
E que todos os novos universitários assimilem, dentro e fora das salas de aula, o pensar do saudoso poeta pernambucano João Cabral de Mello Neto: “E não há maior resposta que o espetáculo da vida”.
PS. Todo cuidado para com as ânsias de aparecer a qualquer preço, tornando-se conhecido por cinco minutos. Igualzinho aquele personagem todo piercingado de um reality show que tirou a sunga na piscina buscando mostrar seu pontinho, um pinto que é menos um terço de uma mera reticência. Ou aquela sogra de jovem alemã assassinada, que aparece nos jornais para proclamar, sem qualquer classe, que o filho era corno.
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Besteirol em tempos de Momo
Uma característica sempre presente nos tempos de Momo é o surgimento de incontáveis bobajadas, escritas, faladas e televisadas. Excluindo-se as aberrações explicitadas nas redações do Enem, da lavra de uma juventude que continua sendo vítima das estroinices de uma Educação Nacional repleta de mentiras modernosas, algumas pérolas foram selecionadas pelo jornalista Edson Athayde, do Diário de Lisboa. Uma amostra, para desopilação figadal:
"Parece que ela foi morta pelo seu assassino"; "Ferido no joelho, ele perdeu a cabeça"; "Quatro hectares de trigo foram queimados, a princípio trata-se de um incêndio"; "O velho, antes de apertar o pescoço de sua mulher até a morte, suicidou-se"; “No corredor do hospital psiquiátrico, os doentes corriam feitos loucos”; "Ela contraiu a doença na época em que estava viva"; "O aumento do desemprego foi de 0% em novembro"; "Esta nova terapia traz esperanças a todos aqueles que morrem de câncer a cada ano"; "Apesar da meteorologia estar em greve, o tempo esfriou ontem intensamente"; "Um surdo mudo foi morto por um mal entendido"; "A vítima foi estrangulada por golpe de facão"; "Este ano, as festas de 4 de setembro coincidem exatamente com a data de 4 de setembro, que é a data exata, pois o 4 de setembro é um domingo".
Para completar a dose acima, outras besteiradas foram retiradas de registros oficiais de tribunais situados no além mar. Eis uma seleção que teria ótimo destaque no Equiness Book:
“Foi este o mesmo nariz que você quebrou quando criança?”; “Então, doutor, não é verdade que quando uma pessoa morre durante o sono, na maioria dos casos ela o faz de maneira calma e não se dá conta de nada até a manhã seguinte?”; “Foi você ou seu irmão que morreu na guerra?”; “O filho mais jovem, o de 20 anos, quantos anos ele tem?”; “Você tem filhos ou coisa do gênero?”; “Vou lhe mostrar a Prova 3 e peço-lhe que se reconheça na foto. Você estava presente quando esta foto foi tirada?”; “Então, Sr. Johnson, como o seu casamento acabou? - Por morte. - E ele acabou pela morte de quem?”; “Há quanto tempo você está grávida? - Vai completar 3 meses no dia 8 de novembro. - Então, aparentemente, a data da concepção foi 8 de agosto. - Sim. - E o que você estava fazendo?”; “Sra. Jones, quantas vezes a sra. cometeu suicidio?”; “Ela tinha 3 filhos, certo? - Sim. - Quantos meninos? - Nenhum. - Tinha alguma menina?”; “Você não sabe o que era, nem com o que se parecia, mas você pode descrever?”; “Você disse que a escada descia para o porão. Essa escada, ela também subia?”; “O sr. está qualificado a apresentar uma amostra de urina? - Sim, desde criancinha.”
Assistindo alguns programas de televisão, recordo trecho de uma carta de Euclides da Cunha, reconhecendo sua gritante atualidade: “Estamos no período hilariante dos grandes homens-pulhas, dos Pachecos empavesados e dos Acácios triunfantes. Nunca se berrou tão convictamente tanta asneira sob o sol”. E avalio melhor a indignação do autor de Os Sertões, ao rememorar a notável Hannah Arendt, no seu livro Entre o Passado e o Futuro: "O problema da educação no mundo moderno está no fato de, por sua natureza, não poder ela abrir mão nem da autoridade, nem da tradição, e ser obrigada, apesar disso, a caminhar em um mundo que não é estruturado nem pela autoridade nem tampouco mantido coeso pela tradição".
Nós, repetidas vezes, ficamos muito ancorados num aprendizado efetivado no passado. E sentimo-nos bem fundeados sobre coisas que aprendemos quando moços, perdendo, por isso, o bonde da história. Porque o bonde sempre está em movimento e numa velocidade cada vez maior, a exigir continuadas reoxigenações.
Tenho sólida admiração pelos que possuem aquilo que Blaise Pascal definia como “esprit de finesse”. E que é diretamente proporcional ao asco sentido pelos que se imaginam muito acima das divindades, sócios de Deus, igualzinho aquele ajumentado entupido de reais que entrava nas igrejas de óculos escuros para Deus não lhe pedir autógrafo.
Depois da folia de Momo, observemos os caminhos já percorridos e rejeitemos os que não mais nos satisfazem. E verifiquemos as forças que nos restam, especialmente as que fundeiam a dignidade pátria, para que possamos ingressar num novo período, com o nível de besteirol em franco declínio. Inclusive em algumas “falcudades engana trouxas”.
Tags:carnavaldiário de lisboaenemequiness bookeuclides da cunhamomoEnvie para um amigoCompartilheComentários (1)Imprimirpostado em 04.02.10
Copa, Olimpíadas e vícios fatais
Segundo dados colhidos de fontes fidedignas, nos próximos seis anos, em funçãos dos preparativos para a Copa do Mundo 2014 e Olimpíadas 2016, os três níveis de governo desembolsarão uma soma fabulosa. Estimada, preliminarmente, em R$ 130 bilhões de reais, eles serão empregados em transporte rodoviario, metroviário e ferroviário, em mobilidade urbana, saneamento básico, lógica e infraestrutura aeroportuárias, segurança pública, saúde e educação.
Tais gastos requererão um planejamento a curto, médio e longo prazos. Um hábito que, no nosso país, anda com uma efetividade um tanto menosprezada nos últimos tempos. Segundo informações credenciadas, o planejamento da Copa do Mundo 2014 já se encontra defasado, tudo fazendo crer que poderão se repetir os atropelos verificados por ocasião dos Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro. Que estão sendo zelosamente auditados pelo Tribunal de Contas da União.
Atrasos em qualquer etapa da meta estabelecida acarretam tropeços nas licitações e nos contratos, tornando-se indispensável a criação de uma Rede de Fiscalização e Auditoria, integradas pelo TCU e pelos Tribunais de Contas dos Estados e Municípios envolvidos nos dois eventos. Uma Rede que assegure à sociedade o direito de conhecer como estará sendo desenvolvida o cumprimento da programação físico-financeira.
Nos próximos dias, um Portal deverá ser implantado na Internet, favorecendo a ampliação da transparência das iniciativas propostas, orçamentos e execuções financeiras, prazos e cronogramas.
Os dois eventos grandiosos seguramente irão modificar a imagem do Brasil no exterior. As duas importantes conquistas alavancarão o desenvolvimento socioeconômico, possibilitarão a captação de recursos, ampliarão o fluxo turístico, intensificarão a internalização de dinheiro novo; ensejarão ampliação do mercado de trabalho; efetivarão a realização de obras de infra-estrutura e ampliarão a capacitação profissional de muitos milhares de brasileiros. E evitarão a repetição de crítica recente, assinada por Mathias Fifka, docente de Economia e Política Internacional da Universidade Erlangen-Nuremberg, na Alemanha, editada na Folha de São Paulo: “Até que ponto é digno de crédito um país que se tornou defensor da paz e da cooperação internacionais, se ele não consegue garantir a segurança e o bem-estar de seus cidadãos?”
Um balizamento, entretanto, deverá estar sempre presente no dia-a-dia programático dos executores dos dois eventos esportivos. Ele é da autoria de George Bernard Shaw: “O progresso é impossível sem a mudança e aqueles que não conseguem mudar sua mente não conseguem mudar nada”.
Quais seriam as mudanças necessárias para o nosso país? Creio que as principais seriam um combate sistemático ao analfabetismo funcional, fortalecendo o Ensino Fundamental; a erradicação da impunidade e dos seus efeitos multiplicadores terríveis, onde muitos não possuem currículos, apenas longos prontuários; uma disciplina mínima para os profissionais das mais diversas áreas, eliminando-se as “culturas de fingimento”, mais blá-blá-blá que fazer concreto; a redução das apoliticizações cínicas que ensejam a perpetuação de uma mesma tecnocracia nunca desinstalada dos cocurutos do mando; a contenção das práticas populistas que amortecem a tesão pelo fazer e a vontade de vencer; refreamento dos assistencialismos com ausência de profissionalização; maiores conscientizações midiáticas sobre os perigos dos fundamentalismos moralistas e puritanos; repúdio às classificações dadas ao civismo como coisa superada, ultrapassada; e continuados alertas sobre individualismos cínicos e individualidades miméticas.
Diante dos desafios portentosos que se afiguram para os amanhãs esportivos brasileiros, necessário se torna ampliar a capacidade estratégica das instituições envolvidas na formatação dos cenários futuros pós-eventos, fortalecendo uma capacidade associativa indutora de coalizões suprapartidárias, fomentadoras de criatividades nunca nostálgicas.
E sempre levar na mais alta conta a advertência de um gênio lusitano chamado Fernando Pessoa: Fiz de mim o que não soube, / E o que podia fazer de mim não o fiz, / O dominó que vesti era errado (...) Quando quis tirar a máscara, Estava pregada à cara. / Quando a tirei e me vi no espelho, / Já tinha envelhecido.
O desenvolvimento brasileiro anseia pelo sucesso dos dois grandiosos eventos.
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perfilFernando Antônio Gonçalves
Descrição
Pesquisador social e professor da Universidade Federal de Pernambuco e Universidade de Pernambuco, Fernando Antônio Gonçalves é um eterno aprendiz. Atualização semanal.
segunda-feira, 26 de julho de 2010
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