quem sou eu:
Não é que vivo em eterna mutação, com novas adaptações a meu renovado viver e nunca chego ao fim de cada um dos modos de existir. Vivo de esboços não acabados e vacilantes. Mas equilibro-me como posso, entre mim e eu, entre mim e os homens, entre mim e o Deus. É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo" Clarice Lispector
TEMPO QUE FOGE…
Ricardo Gondim
Contei meus anos
e descobri que terei menos tempo para viver daqui para frente
do que já vivi até agora.
Sinto-me como aquele menino
que ganhou uma bacia de jabuticabas.
As primeiras, ele chupou displicente,
mas percebendo que faltam poucas,
rói o caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados.
Não tolero gabolices.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram,
cobiçando seus lugares,
talentos e sorte.
Já não tenho tempo para projetos megalomaníacos.
Não participarei de conferências
que estabelecem prazos fixos para reverter a miséria do mundo.
Não vou mais a workshops onde se ensina
como converter milhões usando uma fórmula de poucos pontos.
Não quero que me convidem
para eventos de um fim-de-semana com a proposta
de abalar o milênio.
Já não tenho tempo
para reuniões intermináveis para discutir estatutos, normas,
procedimentos parlamentares e regimentos internos.
Não gosto de assembléias ordinárias
em que as organizações procuram se proteger
e se perpetuar através de infindáveis detalhes organizacionais.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas,
que apesar da idade cronológica, são imaturos.
Não quero ver os ponteiros do relógio avançando
em reuniões de “confrontação”, onde “tiramos fatos à limpo”.
Detesto fazer acareação de desafetos
que brigaram pelo majestoso cargo de secretário do coral.
Já não tenho tempo para debater vírgulas,
detalhes gramaticais sutis,ou sobre as diferentes traduções da Bíblia.
Não quero ficar explicando porque gosto
da Nova Versão Internacional das Escrituras,
só porque há um grupo que a considera herética.
Minha resposta será curta e delicada: - Gosto, e ponto final!
Lembrei-me agora de Mário de Andrade que afirmou:
“As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos”.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos.
Já não tenho tempo para ficar explicando aos medianos
se estou ou não perdendo a fé porque admiro
a poesia do Chico Buarque e do Vinicius de Moraes; a voz da Maria Bethânia; os livros de Machado de Assis, Thomas Mann, Ernest Hemingway e José Lins do Rego.
Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana;
que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos,
não se considera eleita para a “última hora”;
não foge de sua mortalidade,defende a dignidade dos marginalizados, e deseja andar humildemente com Deus.
Caminhar perto delas nunca será perda de tempo
" O Louco ". Gibran
Perguntais-me como me tornei louco. Aconteceu assim:
Um dia, muito tempo antes de muitos deuses terem nascido, despertei de um sono profundo e notei que todas as minhas máscaras tinham sido roubadas – as sete máscaras que eu
havia confeccionado e usado em sete vidas – e corri sem máscara pelas ruas cheias de gente gritando: “Ladrões, ladrões, malditos ladrões!”
Homens e mulheres riram de mim e alguns correram para casa, com medo de mim.
E quando cheguei à praça do mercado, um rapaz no cimo do telhado de uma casa gritou: “É um louco!” Olhei para cima, para vê-lo.
O sol beijou pela primeira vez a minha face nua.
Pela primeira vez, o sol beijava a minha face nua, e a minha alma inflamou-se de amor pelo sol, e não desejei mais as minhas máscaras.
E, como num transe, gritei: “Benditos, benditos os ladrões que roubaram as minhas máscaras!”
Assim tornei-me louco.
E encontrei tanta liberdade como segurança na minha loucura: a liberdade
TEMPO QUE FOGE…
Ricardo Gondim
Contei meus anos
e descobri que terei menos tempo para viver daqui para frente
do que já vivi até agora.
Sinto-me como aquele menino
que ganhou uma bacia de jabuticabas.
As primeiras, ele chupou displicente,
mas percebendo que faltam poucas,
rói o caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados.
Não tolero gabolices.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram,
cobiçando seus lugares,
talentos e sorte.
Já não tenho tempo para projetos megalomaníacos.
Não participarei de conferências
que estabelecem prazos fixos para reverter a miséria do mundo.
Não vou mais a workshops onde se ensina
como converter milhões usando uma fórmula de poucos pontos.
Não quero que me convidem
para eventos de um fim-de-semana com a proposta
de abalar o milênio.
Já não tenho tempo
para reuniões intermináveis para discutir estatutos, normas,
procedimentos parlamentares e regimentos internos.
Não gosto de assembléias ordinárias
em que as organizações procuram se proteger
e se perpetuar através de infindáveis detalhes organizacionais.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas,
que apesar da idade cronológica, são imaturos.
Não quero ver os ponteiros do relógio avançando
em reuniões de “confrontação”, onde “tiramos fatos à limpo”.
Detesto fazer acareação de desafetos
que brigaram pelo majestoso cargo de secretário do coral.
Já não tenho tempo para debater vírgulas,
detalhes gramaticais sutis,ou sobre as diferentes traduções da Bíblia.
Não quero ficar explicando porque gosto
da Nova Versão Internacional das Escrituras,
só porque há um grupo que a considera herética.
Minha resposta será curta e delicada: - Gosto, e ponto final!
Lembrei-me agora de Mário de Andrade que afirmou:
“As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos”.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos.
Já não tenho tempo para ficar explicando aos medianos
se estou ou não perdendo a fé porque admiro
a poesia do Chico Buarque e do Vinicius de Moraes; a voz da Maria Bethânia; os livros de Machado de Assis, Thomas Mann, Ernest Hemingway e José Lins do Rego.
Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana;
que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos,
não se considera eleita para a “última hora”;
não foge de sua mortalidade,defende a dignidade dos marginalizados, e deseja andar humildemente com Deus.
Caminhar perto delas nunca será perda de tempo
" O Louco ". Gibran
Perguntais-me como me tornei louco. Aconteceu assim:
Um dia, muito tempo antes de muitos deuses terem nascido, despertei de um sono profundo e notei que todas as minhas máscaras tinham sido roubadas – as sete máscaras que eu
havia confeccionado e usado em sete vidas – e corri sem máscara pelas ruas cheias de gente gritando: “Ladrões, ladrões, malditos ladrões!”
Homens e mulheres riram de mim e alguns correram para casa, com medo de mim.
E quando cheguei à praça do mercado, um rapaz no cimo do telhado de uma casa gritou: “É um louco!” Olhei para cima, para vê-lo.
O sol beijou pela primeira vez a minha face nua.
Pela primeira vez, o sol beijava a minha face nua, e a minha alma inflamou-se de amor pelo sol, e não desejei mais as minhas máscaras.
E, como num transe, gritei: “Benditos, benditos os ladrões que roubaram as minhas máscaras!”
Assim tornei-me louco.
E encontrei tanta liberdade como segurança na minha loucura: a liberdade
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