A regulamentação da sexualidade consiste em retirá-lo do subsolo da desmoralização e da doença que predominou na idade moderna, sobretudo com a religiosidade e o racionalismo da ciência, e torná-la reconhecidamente uma dimensão fundamental para a saúde física e psíquica do ser humano. Contudo, com isso um império de regulamentos, significados e conceitos, acabam por desencadear configurações da moral e da ética na sexualidade que passou a ser objeto vastamente abordado e estudado. A atividade sexual de homens e mulheres passam agora a ser diferenciada de acordo com os métodos corretos que para ela se prescreve, sendo que uma característica desses métodos é disfarçadamente incluir uma prescrição de que a sexualidade não deve ser compreendida pela imposição universal, mas sim em sua singularidade. Mas, se por um lado a imposição universal sobre o sexo perdeu seu espaço para a individualidade das manifestações sexuais, cresceu consideravelmente o número de instâncias que delimitam as variadas opções de mercado à disposição para a constituição da sexualidade humana. Se é possível falar em configurações de valores até então tidos como intocáveis nas instituições da família, da divisão sexual do trabalho, das diferenças de sexo e gênero, da religião, entre outras, parece não ser possível vislumbrar mudanças radiais que tenham realmente conseguido tornar a vida sexual de homens e mulheres na sua manifestação livremente espontânea e natural que independe de qualquer justificativa senão a satisfação do prazer – certamente que a liberdade aqui também é a liberdade do outro em se opor ao meu desejo -, pelo contrário, requer-se e demanda uma vigilância ainda maior sobre a sexualidade.
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Talvez Santo Agostinho fosse mais livre sexualmente do que os jovens de hoje que se perdem entre tantos dispositivos de regulação sexual… swing, BDSM, frotteurismo, bondage, BBW, ménage… qual distintivo vou vestir? posso misturar vários? qual deles combina mais comigo? estarei bem representado nesse grupo? – O prazer sexual independe de justificativa, porém, cria-se regulamentações para os prazeres.
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Tentar colocar a camisinha em xeque é o mesmo que tentar colocar a existência de Deus em xeque na época de Moisés e Abraão.
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À civilização, talvez o progresso da camisinha se dê quando os “pênis” passarem a ser naturalmente plastificados.
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O barulho da embalagem da camisinha sendo rasgada costuma excitar mais do que a última peça de roupa íntima que cai.
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Com licença, devo lhe tratar por homem ou mulher?
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Se não tiver sabor de morango eu não vou querer…
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Costuma-se falar mais de AIDS do que de sexo.
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A repressão do sexo na idade moderna consistia em torná-lo conteúdo oculto e silenciado. Nos nossos dias a repressão se dá pelo falatório sobre o sexo: temos pedagogias, ciências, métodos e profusos recursos para regulação do que os corpos fazem e pensam sobre sexualidade. Aquele controlava pelo silêncio, este regula pelos saberes: tornamos nossa miséria sexual burocrática para fins de manejo.
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Quanto maior o estado de miséria sexual que se vive maior é a fertilidade dos manuais, códigos de etiquetas e comportamentos para se dizer sobre as múltiplas técnicas que fazem parte da sexualidade.
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“Vamos fazer uma coisa diferente hoje amor!” – E se tornaram libertos sexualmente.
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Somos um casal liberal, ela é minha e ele é meu.
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Nunca o sexo foi tão controlado como antes: a música, o perfume, a roupa, o restaurante, o tema do motel, a ocasião especial, o como fazer, o tipo de lingerie, o tipo de marca que melhor diz o meu perfil sexual, o que a sexóloga e o psicanalista disseram, a dança que se usa para não deixar o relacionamento arrefecer, as técnicas para se atingir o corpo perfeito, a dieta afrodisíaca, o que se aprende com a apresentadora do programa de sexo… inúmeras são as dimensões em que o sexo é manejado.
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Se a definição de prostitutas for mulheres que fazem sexo por dinheiro, então se incluí aí as esposas respeitosas e virtuosas dos maridos-patriarcas: homem certo, comprometido com a verdade e honesto segundo os ditames da burguesia.
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As prostitutas não foram sempre desprezadas. Já foram sacerdotisas sagradas, prestaram seus serviços em templos a homens que tinham por elas absoluto respeito e foram uma forma de homenagem aos deuses e deusas pela fertilidade. Mas é melhor tratá-las como bruxas quando o assunto é Deus pois ele nunca gostou de sexo, nem mesmo para conceber o seu filho. Se o assunto não for Deus, mas as nossas sagradas e cristãs famílias burguesas modernas, é melhor excomungá-las, pois não é nada interessante que as riquezas não sejam passadas aos seus legítimos herdeiros.
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Na perspectiva do amor-romântico-cristão costuma-se ter que provar que não se quer sexo para se conseguir o sexo.
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Eu não estou cara, estou é muito desvalorizada! Já fez as contas quanto precisou gastar pra levar sua namorada pra cama pela primeira vez? – Disse a prostituta ao burguês que solicitara desconto.
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Quanto maior o recato, mais explosivos costumam ser os desejos da carne: não se preserva muito senão quando não se teme perder o controle das armas que se têm: já me masturbei imaginando estar na casa de Deus, Jesus Cristo, sereno e de triste alegria, contemplava tudo do ângulo perfeito de um altar, estático, ele e a cruz, formavam um só corpo, assim como devorávamos eu e a freira unidos em uma mesma carne.
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